Sobre o LAPA

O LAPA (Laboratório de Estudos e Práticas da Autogestão), muito modestamente, se propõe como um pequeno círculo de amigo(a)s e camaradas que possuem vínculos, afinidades, afetos e interesses em comum em torno do tema da auto-organização popular, talvez, como uma via possível para a emancipação de todos os subalternos e trabalhadores. Assim, é uma aposta simultânea na amizade e na revolução.

Por hora, o LAPA não se constitui como um coletivo, uma entidade ou uma organização, ainda que em potecial possa vir a ser isso ou outras coisas que nem sequer imaginamos. Como círculo, temos vínculos que nos unem para além do espaço que nos separa. Os estudos e ações que compartilharemos como círculo pode inclusive dar fôlego e alento para a formação e/ou consolidação de iniciativas coletivas e/ou individuais, nos mais distintos lugares onde nos situamos como vizinhos, estudantes, trabalhadores, etc.

A idéia de Laboratório, até agora sugerida, nasce como uma metáfora que se orienta pela dimensão experimentalista que carrega todo laboratório – e isso nos interessa particularmente, experimentar idéias e práticas, aprender e se apropriar do melhor dos processos políticos e sociais dos mais diversos movimentos de liberação que se levantaram contra todas as ordens e esquemas de dominação (inclusive os de esquerda). E mais: nosso laboratório é de bolso, se materializa e desmaterializa segundo determinadas condições ambientais e temperamentais, e talvez seremos muito mais tomados e possuídos pelas experiências do que a dissecaremos e a controlaremos, ao contrário do que ocorre com os homens-de-guarda-pó.

E se nos lançaremos a estudar e praticar a autogestão é porque ela todavia nos parece ser a melhor forma encontrada pelos dominados até hoje para que a terra, os meios de produção, o trabalho e a política (com ou sem o Estado) não se converta em monopólio e privilégio de uns poucos, e logo, instrumento de dominação, opressão e submissão de classe, casta, grupos ou camarilhas. E para isso é importante que nos alimentemos das teorias e narrativas que fundaram a autogestão como um princípio político, e que transcende, aliás, muitos projetos políticos ou ideologias (como o anarquismo e o comunismo); e ao mesmo tempo buscar compreender os caminhos e as vicissitudes das experiências de autogestão que tiveram curso, especialmente, na história moderna.



sexta-feira, 5 de novembro de 2010

MANIFESTO DA OCUPAÇÃO GUERREIRO URBANO

Hoje, o Rio de Janeiro passa por um momento dos mais preocupantes. O déficit habitacional do município é maior do que 150.000 (estimativa oficialmente subestimada), sendo que em cada 10 pessoas que necessitam de moradia, 9 ganham entre 0 a 3 salários mínimos. Mesmo com tanta gente precisando de moradia, existem mais de 220 mil domicílios vagos no município do Rio de Janeiro. Destes, grande parte fica ocioso durante décadas em um claro descumprimento da legislação brasileira. A Constituição Federal do Brasil diz que toda a propriedade, seja ela rural ou urbana, precisa cumprir a sua função social. Se o proprietário não dá a ela uma função ele está infringindo a lei e, portanto, o Estado deve agir para fazer valer a sua Carta Magna. Contudo, o que acontece quando o Estado torna-se não apenas negligente, mas cúmplice dos proprietários infratores? E quando é o próprio Estado que descumpre as leis pelas quais diz zelar? O Estado democrático deveria estar a serviço do povo trabalhador e não do capital imobiliário!!!

A população pobre urbana carioca vive mais um grande ataque perpetuado pelo Estado e suas esferas de governo. Políticas públicas como o Choque de Ordem, a “revitalização” da zona portuária, as UPPs e o programa Minha Casa Minha Vida, conjuntamente, acabam agravando a periferização da pobreza e beneficiam diretamente grandes construtoras e os especuladores imobiliários. Na Zona Portuária (local de grande tradição para a população pobre carioca), a pseudo-revitalização não esconde o seu principal objetivo: substituir a população pobre por uma população de classe média. Além dos despejos ilegais e da expulsão branca (já que, aumentando o custo de vida, fica difícil permanecer na região), o pobre urbano, principalmente o camelô, é perseguido como se fosse um ladrão por uma Guarda Municipal que é cada dia mais covarde, violenta e criminosa. O Estado não hesita em incluir os camelôs em suas estatísticas na categoria de empregados, mas rouba e espanca o trabalhador com um discurso de criminalização do trabalho informal. Como podemos aceitar políticas públicas que expulsam o pobre da sua moradia e retiram o seu único meio de sobrevivência? Fica claro que a Prefeitura deseja sufocar o trabalhador pobre que reside no Centro e empurrá-lo para a periferia. E em contrapartida? A Prefeitura promete uma casa no fim do mundo com o programa Minha Casa Minha Vida – bem longe de todos os serviços dos quais precisamos (saúde, trabalho, transporte, educação, lazer...). Ou então, oferece um aluguel social de 400 reais – que, além de não sustentar nenhuma moradia próxima ao Centro, é suspenso pela Prefeitura quando ela bem entende.

Queremos moradia porque é um direito garantido pela Constituição! E dizemos que ela precisa ser no Centro porque trabalhamos aqui. Mas também porque é aqui que estão as melhores escolas públicas, os melhores hospitais, creches, teatros, centros culturais e bibliotecas. Afinal de contas, não é só a moradia que é um direito constitucional, mas também a saúde, a educação, a cultura e o trabalho. Além disso, segundo o IPP (Instituto Pereira Passos), na Zona Portuária, 1 em cada 4 imóveis está vago. E, se não bastasse, reconhece que grande parte desses imóveis são públicos! Portanto, não queremos aluguel social: ele não resolve o problema da moradia. E não queremos casas longe do nosso trabalho: queremos qualidade de vida, acesso à cultura, à educação e à saúde também. Temos o direito de ter acesso à cidade que ajudamos a construir!

Por isso, hoje, dia 1 de novembro nós ocupamos este prédio que há décadas se encontrava abandonado, deixado de lado, “sem vida”. Ocupamos porque a verdadeira revitalização será feita por nós! Nós, trabalhadores e trabalhadoras, cansados de tanta opressão, nos organizamos há meses para hoje nos juntarmos a outras tantas vozes e dizermos: Basta! Se o Estado não cumpre a lei, nós a faremos cumprir, pois somos nós que tivemos nossos direitos usurpados, nós que sofremos com a violência diária e nós que construímos e continuamos a construir essa cidade. Cidade esta que por trás de uma máscara “maravilhosa” esconde o rosto e as marcas da pobreza e da violência. As soluções do poder público não nos servem, já que continuamos sendo tratados com todo o desprezo, como criminosos, como um lixo humano.

Cansamos de esperar o poder público agir! Cansamos de ver o governo trair a população para beneficiar os verdadeiros criminosos e especuladores! Ocupamos para mostrar que dos nossos olhos não rolam só as lágrimas de desespero pela injustiça que sentimos na pele todos os dias. Com nossos olhos também vemos que, se é com nossas mãos que a cidade conta para crescer, é com elas também que vamos contar para construir juntos as soluções para nossos problemas. Os direitos de todos também são nossos. Se não nos dão, só nos resta tomá-los.

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